Precisamos de mais Hackers
A filosofia hacker tem o potencial de impactar de maneira positiva toda a vida no planeta. Da medicina a produção de alimentos, precisamos…
A filosofia hacker tem o potencial de impactar de maneira positiva toda a vida no planeta. Da medicina a produção de alimentos, precisamos de mais hackers.
Passei a última semana estudando no MIT e entre uma aula e outra tive a sorte de assistir a final de sua competição anual de startups, a MIT 100K. Esperava ver um monte de startups de Internet e tive várias surpresas durante o evento. A primeira delas foi saber que os Estados Unidos tem um CTO com foco em trazer o pensamento das startups e da cultura hacker para as áreas governamentais. Todd Park entrou no palco dizendo por que é tão importante trazer a cultura do empreendedorismo e dos hackers para o governo.
Um de seus focos é o uso de dados — Big Data — para melhorar áreas como a
saúde e a segurança pública. A segunda surpresa foi a de ver que a maioria dos projetos finalistas não eram de Internet ou ligados à computação. Eram, na realidade, idéias muito simples aplicadas a resolver problemas nas mais diversas áreas, de medicina a embalagens, de energia e piscicultura. Sim, o que eu via ali era a manifestação da cultura hacker em sua essência. Aqueles estudantes aplicavam seus conhecimentos para melhorar coisas já existentes ou para resolver problemas, e com isto tornar a vida mais fácil e o mundo melhor.
Apenas para evitar confusões, é importante salientar que não estou falando aqui dos hackers que atuam descobrindo e explorando falhas de segurança em sistemas computacionais, mas sim daqueles que utilizam seus conhecimentos para explorar e modificar o mundo a seu redor.
A idéia é que a filosofia hacker pode ser utilizada em todos os aspectos de nossas vidas e de uma maneira bastante positiva. Mas, talvez, o mais interessante seja trazer isto para dentro das empresas. Seja alterando um pequeno processo interno, uma parte de seu produto ou encontrando modos criativos de quebrar as regras estabelecidas para buscar um bem maior e melhoria do que fazemos. Porém, para isto precisamos criar um ambiente que permita este tipo de pensamento florescer, coisa que a maioria das corporações sofrem para conseguir. O principio básico é que profissionais criativos e que conhecem os mais pequenos detalhes de sua atividade tem condições de confrontar os modelos estabelecidos e buscar modos de entortá-los, sem quebrá-los, para conseguir resultados melhores. Porém, o dia-a-dia nem sempre permite este tipo de pensamento e os incentivos em geral são em outra direção.
Voltando ao MIT, um dos exemplos que mais chamaram a atenção foi de um hack que pode aumentar a produção de fazendas de peixe em até 30%. Ou seja, eles estavam hackeando a vida. A idéia era simples: fazendas de peixe não conseguem ovos de peixes durante o ano todo devido a sazonalidade da produção dos mesmos e a impossibilidade de congelar ovos para serem usados nos períodos de entre-safra. Então, os estudantes conseguiram um jeito de hacker os ovos. Um tratamento especial faz com que as membranas dos ovos fique permeável a um outro produto que, ao entrar nos ovos, permite que os mesmos sejam congelados sem danificá-los. Outro hack legal foi de um grupo que criou um revestimento especial para embalagens de alimentos que torna as embalagens super anti-aderentes, permitindo que o que estiver armazenado lá dentro seja facilmente retirado, como por exemplo aquele resto de maionese que insistir em ficar no vidro. Uma idéia simples que pode economizar toneladas de alimentos todos os meses.
Hackear a criação de peixes e embalagens é muito legal. Mas, que tal pensarmos maior! A cultura hacker cabe em qualquer lugar e tem o potencial de impactar de maneira muito positiva a vida no planeta terra. E é para isto que precisamos de mais hackers e de criar ambientes que incentivem esta cultura. Precisamos hacker a medicina, a educação, o governo, a produção e o consumo de energia, a produção de alimentos, o acesso a Internet, tudo! Hackers do mundo, uni-vos e vamos hackear o planeta!
Artigo publicado originalmente na edição de Junho de 2012 da Revista INFO e republicado aqui com a permissão da Editora Abril.