Obrigado Internet
A Web no Brasil está completando 20 anos e a coluna deste mês é minha maneira de agradecer por tudo que consegui com a Internet até agora.
A Web no Brasil está completando 20 anos e a coluna deste mês é minha maneira de agradecer por tudo que consegui com a Internet até agora.
Meus primeiros contatos com a Internet começaram um pouco antes da Web aparecer, antes de me mudar de Araguari para Campinas para me preparar para o vestibular da UNICAMP, mas foi quando ingressei numa das primeiras turmas do curso de Engenharia da Computação em 1993 que a Internet começou a mudar de vez a minha vida.
Minha idéia inicial era trabalhar com computação gráfica, graças a minha fascinação por videogames e pelo trabalho do Hans Donner, com suas vinhetas na Globo. Mas logo no meio do primeiro ano mudei de idéia, em parte pelo que ouvia dizer da matemática da computação gráfica e do impacto das primeiras provas de cálculo, mas principalmente porque um de meus professores me mostrou uma “nova novidade” chamada MOSAIC. O MOSAIC foi um dos primeiros navegadores web a serem desenvolvidos. Me lembro bem do impacto que foi olhar para a janela do navegador enquanto, aos poucos, a página de algum site de algum laboratório de pesquisa do outro lado mundo era carregada lentamente. Ao mesmo tempo, o professor tentava me explicar o que era aquela tecnologia e suas possibilidades. Abrimos várias janelas — as abas ainda não existiam — e saímos explorando a “teia do tamanho do mundo”, a World Wide Web. No final daquele papo, eu sabia que era por ali o caminho que eu trilharia com a computação. Durante o restante do curso fiquei cada vez mais envolvido com a Internet e com o mundo das redes de computadores. No lado acadêmico me enveredei por fazer pesquisas e começar um mestrado que nunca concluí na área de computação de alto desempenho e super computação. Algo como os primórdios da computação em nuvem. E, em paralelo, comecei a estudar cada vez mais a tal da web, passei a cuidar do site do departamento onde fazia minha iniciação científica e criei meu primeiro site pessoal. Uau, eu era um “webmaster”! Este era o nome que dávamos para as pessoas que criavam e mantinham sites na Internet.
A imagem que usei aqui no artigo do Medium (e que não estava na publicação original) é um print de uma das primeiras versões de minha "home-page". Esta página era hospedada num dos servidores do Departamento de Sistemas de Energia Elétrica da Faculdade de Engenharia Elétrica e Computação da UNICAMP. A captura foi feita em Março de 1997 pelo Internet Archive. Você ter uma idéia de como era visitar estes sites visitando o Internet Archive.
Eu nem imaginava que estes caminhos paralelos seriam uma constante em minha vida, que mais tarde se cruzariam na maior virada profissional que experimentei e que mudaria de vez a minha carreira. A coisa funcionava mais ou menos assim: minhas principais atividades acadêmicas ou profissional eram sempre na área de computação, mas nunca eram diretamente relacionadas à Internet ou à Web. Trabalhei com computação de alto desempenho, sistemas de informação em saúde inspirados nas tecnologias da Internet, soluções de pagamento, mas até o final de 2006 eu nunca havia ganhado um centavo com a Internet. No segundo plano, num caminho paralelo, eu passava grande parte do tempo fuçando e brincando com as tecnologias da Internet. Era um usuário ávido e dormia muito pouco para passar mais tempo conectado estudando, conversando com pessoas do mundo todo em chats dos mais diversos tipo, testando todas as novidades que surgiam. E olha que andei me esbarrando com a Internet e com o empreendedorismo digital, mas a realidade é que levou um tempo para a fichar cair e as coisas acontecerem.
Logo que me formei, entre 1997 e 1998 passei uma temporada no Vale do Silício, mas nem me toquei do que estava acontecendo por lá. Ficava entre Mountain View e Palo Alto, mas minha motivação era conhecer os centros de pesquisa da região e as empresas que fabricavam os equipamentos que usava em minhas pesquisas. Antes de voltar para o Brasil, cheguei a participar de um processo de seleção na Netscape, os desenvolvedores do navegador mais badalado do momento, mas o plano era voltar para começar o mestrado.
Não era desta vez que a web me pegaria de vez. O primeiro ensaio de mudar o jogo e colocar a Internet em primeiro lugar aconteceu em 1999 quando fundei o PageMe, minha primeira startup. Por alguns meses, antes da bolha estourar, junto de um primo e alguns amigos, sonhamos com a idéia de conseguir um investimento bastante gordo e nos tornarmos uma grande empresa de Internet móvel. A bolha-ponto-com estourou nos Estados Unidos, chegou com alguns meses de atraso no Brasil e acabou com nossos sonhos. Era hora de conseguir um emprego como engenheiro e dar um jeito de ganhar a vida.
Mais tarde, em 2006, motivado por um amigo que trabalhava comigo resolvi estudar uma nova tecnologia para o desenvolvimento de sites. Depois de alguns dias de estudo resolvi começar um projeto com o intuito de aprender melhor e foi ai que começou a aventura que mudou tudo. O Brasil começava a se apaixonar pelos blogs e o projeto que resolvi criar foi um pequeno diretório de blogs em língua portuguesa chamado BlogBlogs.
Foi com o BlogBlogs que me envolvi de verdade com a Internet e com a web. No começo, ele era apenas um diretório de blogs, com um visual de gosto bem duvidoso e com meia dúzia de blogs cadastrados. Mas, com o apoio de vários amigos que fiz na blogosfera, passei a dedicar as madrugadas a melhorar o sistema e a interagir com os usuários. Foi assim que comecei a entender o real poder da rede. Conteúdo de cauda longa, sendo gerado por milhares de pessoas pelo Brasil começavam a desafiar algumas da maiores propriedades da mídia tradicional. Milhares de criadores de site trabalhando para que o Google entendesse melhor os seus sites e lutando para conseguir um lugar ao sol no topo das páginas de busca. Efeitos de rede acelerando tudo e deixando a vida bem frenética. Nos últimos meses daquele ano eu receberia o primeiro cheque do Google pela publicidade que era apresentada no BlogBlogs. Meses mais tarde, em meados de 2007, me casei, entramos para a lista dos maiores sites do Brasil e comecei a pensar seriamente em abandonar a carteira assinada como diretor de tecnologia numa multinacional para virar um empreendedor da Internet.
Mas como já estourei os limites de tamanho para a coluna, vamos fazer uma viagem em fast-forward daqui pra frente. A idéia de virar empreendedor saiu do papel e no começo de 2008, sempre apoiado pela minha esposa Isabella, pedi demissão de meu emprego, vendi o BlogBlogs para o Grupo Abril e criei uma nova empresa de Internet para eles. Daquele momento em diante, passei a respirar a Internet como minha principal atividade e as aventuras foram muitas. Passei os últimos seis anos trabalhando com um monte de gente interessante e experimentando na intensidade máxima toda as novidades do universo digital. A explosão dos smartphones, a chegada dos tablets e os desafios da transformação digital.
Hoje, posso dizer que completei o primeiro ciclo de minha história com a Internet. Faz seis meses que mudei novamente de carreira e agora me dedico a ajudar outros empreendedores da Internet brasileira a realizarem os seus sonhos e mudarem as suas vidas e as vidas de milhões de outros usuários. E hora de retribuir. O que antes “veio da Internet”, agora é “para a Internet”.
Estamos vendo apenas o começo da revolução digital. Minha história é uma no meio de milhares de outras muito mais interessantes e relevantes, mas espero que ela sirva de inspiração para outros navegadores deste oceano digital. Agradeço, imensamente, aos desbravadores que permitiram que tudo isto acontecesse e que nos proporcionaram tantas aventuras. Tenho certeza que os próximos vinte anos serão ainda mais incríveis e desejo que outros tenham ainda mais histórias pra contar. HeyHo!
Artigo publicado originalmente na edição de Julho de 2015 da Revista INFO e republicado aqui com a permissão da Editora Abril.